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Eduardo Pereira Monteiro
Criar Franca

Carta ao Pai Nosso

Franca, 09 de setembro de 2010.

Prezado Pai Nosso que Estais no Céu,

Antes de santificar o Vosso nome venho reivindicar o que me impusera: o medo. Sou morador de rua de uma cidade do interior paulista. Fui alfabetizado por um ex-companheiro de roubo que optou por essa vida, diferente de mim, nascido nela. Durante mais um furto semanal, fui flagrado por um rapaz bem vestido que me punira drasticamente ao entregar-me um livro chamado Bíblia. Como me arrependo de tê-lo lido, Senhor.

Pai, estou aqui para justificar-me antes que seja feita a sua vontade e o juízo final condene minha vida vulgar com o preço da eternidade no inferno. Estou nessa vida desde que nasci, aliás, nunca conheci outra. Nunca entendi a razão da minha existência, e o pior, agora temo a ela.

Senhor, nunca desfrutei do pão nosso de cada dia, daí a necessidade de furto para que a fome não furtasse minha vida. A existência nunca me perdoou por ser quem sou, logo não consigo perdoá-la pelo mal que me fez. Deus, nunca caí na tentação, afinal de contas, nunca saí dela.

Altíssimo, meu amigo é de mármore e sempre o idolatrei pela sua fidelidade em ouvir-me e entender - me. Não tomei em vão seu nome, poucas vezes o escutei. O sábado guardei para roubar, era mais fácil no meio daquele tumulto em dia de compras. Com uma golpeada certeira de faca matei um policial que jogara meu alimento fora para mostrar-me a futilidade da minha vida.

E o que me resta, Pai, é cobiçar. Não existe mulher que se atraia por mim, inibindo qualquer possibilidade de adultério, predestinando as outras ao meu instinto reprodutor. Não tenho pertences, não pertenço a ninguém, o que me sobra é sonhar, com o do outro. Não dei falso testemunho contra meu próximo, ninguém se aproxima de mim para que haja essa possibilidade.

Deus, o temor que pavora minha alma está acima de qualquer sofrimento físico. Não me considerava pobre, e sim podre, mas agora tenho um sofrimento a mais, causado por aquele livro burguês. Eles, sim, são capazes de limitarem-se. Eu nasci limitado. Suas próprias leis são inacessíveis a mim. Não rendo, rendo-me. E o que hoje me fortalece é acreditar na possibilidade de não ser filho Seu, e livrar-me da sua ira. O meu maior medo e sofrimento foi causado por Sua palavra. Sinceramente, prefiro aquele de mármore que sempre esteve comigo e nunca me condenou-me pelo que sou. Pelo menos, já sei quem circunstanciou tudo isso.

Amém