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Ana Izabel Nasser
Criar Araraquara

Heróis líquidos da pós-modernidade

Forte. Justo. Belo. De Aquiles ao Super-Homem, o papel do herói foi sempre evidentemente idealizado. Dotado de poderes "sobrenaturais" e impulsionado por valores coletivos, ele contrasta com a áspera realidade vigente, marcada pela exploração, desigualdade e individualismo, combatendo o "mal" e assumindo uma grande responsabilidade ante a sociedade. Entretanto, essa figura parece distanciar-se de nossa contemporaneidade, cuja liquidez pare cada vez mais deuses temporários, que já não se enquadram nesse senso comum.

No passado, nomes como Martin Luther King, Nelson Mandela, Dalai Lama ou Che Guevara personificavam bem o ideal heroico: alguém que combate a injustiça étnica e social, que busca melhorar a sociedade em que vive. No contexto da pós-modernidade, no entanto, é difícil citar um exemplo de herói ideal; não porque eles simplesmente deixaram de existir, mas principalmente porque são construídos e desconstruídos rapidamente com o fluxo de informações. Atletas, ativistas políticos ou revolucionários sociais: todos são criados, derramados à população por meio da mídia, para, então, serem fadados ao esquecimento.

Assim, devido à geração fluida na qual nos encontramos, como descrita por Zygmunt Bauman, sociólogo polonês, nada mais apresenta permanência, nada se fixa: tudo passa, monta-se e desmonta-se consecutivamente, numa ideia heráclita de puro movimento, de forma que nomes aparecem e desaparecem, dúvidas afligem o homem e tornam cada vez menos nítido o que é o bem, o que é o mal e qual a postura certa a se tomar. No filme "Corpo Fechado", por exemplo, o herói é retratado receoso, em meio à escuridão e incerteza, questionando a própria dualidade entre o bem e o mal e a necessidade de assumir uma responsabilidade maior.

O verdadeiro herói, dessa forma, passa a ser representado por aqueles que conseguem, mesmo sem ter condições, sobreviver aos fatos sociais que nos permeiam. Trata-se, portanto, dos miseráveis, dos desempregados ou mesmo daqueles que conseguiram se salvar de uma bala perdida ou ter um filho sem o auxílio de uma rede de saúde pública. Isso porque conseguem superar os limites, regras impostas pelo condicionamento capitalista, que os exclui concomitantemente da sociedade sob a justificativa de que "se não consomem, não existem".

Logo, a questão é entender que a concepção do herói ideal modificou-se em nossa sociedade, caracterizada por uma liquidez que gera apenas deuses temporários, "ídolos corriqueiros" que já não permanecem na História. Num contexto de profunda exploração, desigualdade e individualismo, o novo herói torna-se aquele capaz de superar os limites que a sociedade impõe, sobrevivendo a ela - e apenas isso. Estamos todos em movimento contínuo, embalsamados por uma realidade que se constrói e desconstrói diariamente. Não podíamos, por fim, impedir o nascimento de tantos heróis idealizados, líquidos, que se desfazem com um mero clique de nossos meios de comunicação.