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Adilmar Luiz de Souza Jr.
Criar Ribeirão Preto

Montesquieu e o anel

No início do século passado, J. R. R. Tolkien, com o intuito de criar uma mitologia genuinamente inglesa, criou uma das mais esplêndidas metáforas sobre o poder. No épico de "O Senhor dos anéis", Sauron - o senhor do mal - forjou o anel do poder. Muitos ambicionavam possui-lo, no entanto, o anel estava imbuído com a essência maligna de Sauron e quem o detivesse seria, consequentemente, corrompido por ele. Este é o mito, mas qual sua ligação com a realidade?

O ponto de partida da análise é: por que alguém deseja o poder? A primeira explicação que nos ocorre é a utilização deste para se obter riqueza material. Essa avaliação, embora correta em muitos casos, é reducionista. Todos possuímos, em maior ou menor grau, uma relação espinhosa com o mundo que nos cerca. Essa qualidade intrínseca a ser humano faz com quem queiramos sempre mudar algo; deixar o mundo mais condizente com nossas convicções e pretensões. O poder é, portanto, a possibilidade de soldar essa ânsia.

Uma vez obtido, como mantê-lo? Os métodos de preservação são variados. Uma estratégia pode ser a construção de um inimigo comum. Como, por exemplo, o conceito de "raças inferiores" utilizado por Hitler; ou como para Hobbes, que "o homem é lobo do homem" e, por isso, deve ser controlado pelo Estado. Entretanto, a justificativa mais extensamente utilizada foi a religião. "A religião é o ópio do povo", como dizia Marx. Com diversos pretextos, muitos resignaram-se a obedecer. Aí reside um dos mistérios do poder: como tantos contentam-se em subjugar-se e não contestar?

Obtido e assegurado, quais suas consequências? Neste ponto, farei da tese de Tolkien a minha. O principal sintoma, sem dúvida, é que o poder não pode ser controlado. Assim, como o anel do épico, quem o detém é corrompido, tem seu olhar turvado para assuntos externos e afunda-se, cada vez mais, em seu egoísmo. Como ninguém consegue controlá-lo, é o grande mistério do poder. Sem discutir as causas e sendo pragmático, Montesquieu teorizou a divisão dos três poderes, a fim de evitar o caráter individualista e absoluto do poder.

Todos temos, em diferentes graus, uma relação desarmônica com o mundo e, portanto, desejamos alterá-lo. A ferramenta para isto é o poder, e para mantê-lo, porém, não necessárias justificativas e manipulações. Estes, no entanto, são apenas fatos constatáveis. O grande mistério é por que ninguém consegue controlá-lo, como exposto no épico de Tolkien. Sendo um mistério, Montesquieu não tentou decifrá-lo, mas tentou minimizar suas consequências propondo a divisão dos três poderes.