MELHORES REDAÇÕES DE ALUNOS

Marina Cau Ucella
Criar Ribeirão Preto

Caixões Vazios

A meritocracia existe àqueles por ela favorecidos. Ao estudante rico, que pode estudar a vida toda em escolas particulares de excelência, que não teve que aliar estudos ao trabalho para por comida na mesa de casa e que contou com inúmeras atividades extracurriculares, o vestibular, por exemplo, é o suprassumo da igualdade e imparcialidade. Para o pobre, sem estrutura e fadado aos sucateados colégios públicos, é uma muralha que impõe uma falsa igualdade aos que em toda existência viveram desiguais. Como falar em mérito, se não há igualdade? Como culpar o indivíduo por uma existência de descaso social e governamental?

Os "meritocratas" afirmam que a disparidade é demérita dos dois desses alunos, talvez. Se os pais ricos, por seus méritos, puderam pagar um bom colégio aos filhos, a culpa é dos pais pobres por não serem "bons" o suficiente para fazer o mesmo. E, se os pais, por sua vez, não tiveram educação de qualidade, a culpa é dos avós, bisavós, tataravós... O passado é que os condenou. Entretanto, se no passado valia a determinação do berço, e se o passado condena o presente, dito, meritocrático, a meritocracia não passa de um modo muito eficiente de manter uma ilusão de isonomia frente a uma realidade de elitismos perpetuados.

A disparidade é demérita do país desses alunos, não há dúvida. Um país no qual o jornal da manhã, lido por um grande empresário frente a uma farta mesa de café, cobrirá, durante a noite fria, o homem miserável que se encolhe na próxima esquina. A ilusão do mérito, entretanto, a tudo perdoa: a dois seres humanos, dois diferentes tratamentos simplesmente porque um "merece mais" que o outro. E, se a "era do mérito" sucede-se a "era da celebridade", como afirma João Pereira Coutinho, pouco importa. Esta faz apenas acabar com o eufemismo daquela, mostrando a todos, como se preza na sociedade midiática, que o sistema não é justo e "ponto final". O mendigo não tinha méritos, agora não tem fama. Ainda tem fome e frio.

Não enterramos a meritocracia, pois é impossível enterrar um fantasma. O que fazemos atualmente é criar um novo espectro, novas ilusões para confortar os bem-sucedidos no sistema e para acalmar a maioria por ele massacrado. A meritocracia, de fato, nunca existiu, pois, também, nunca existiu a realidade entre os homens. E, sem ela, pouco importam os caixões vazios que enterraremos a cada nova ilusão criada: nada mudará.