MELHORES REDAÇÕES DE ALUNOS

Izabela Barbieri de Freitas
Criar Araraquara

A droga

No filme "Equilibrium", para salvar o mundo, os governantes decidiram criar uma droga capaz de coibir o sentimento humano - para eles, a real fonte de crueldade - e garantir a paz para sempre. Hoje, o mundo pós-industrial, com excedente populacional, deve estar ingerindo doses diárias de Prozium, a droga de "Equilibrium". Afinal, há cada vez mais gente e menos pessoas neste mundo.

Após séculos de predomínio rural sobre as cidades, o mundo presenciou o surgimento da indústria moderna. A intensa utilização do trabalhador assalariado somado ao crescimento populacional, resultado de políticas médicas-sanitárias, proporcionou à multidão traços competitivos: o fracasso do próximo é o que conforta, a depressão causada pela "Língua-faca" do amigo de cursinho é o que fortifica. Para Zygmunt Bauman, esta é uma das razões para o surgimento da "modernidade líquida", caracterizada pelos relacionamentos humanos insólitos e superficiais. De fato, a sociedade pós-industrial está cada vez mais mecânica e menos humana: se antigamente o amor sobressaia, hoje prevalece o dinheiro.

Será que o patrimônio da China pós-industrial foi, assim como nos demais países, somente traços competitivos? No ano passado, câmeras filmaram o atropelamento de uma criança chinesa por dois veículos, 18 pessoas passaram pela menina, quase morta, e nada fizeram. O país asiático deve estar importando juntamente aos vinhos africanos, a seca de muitas partes do continente. Afinal, a aridez do solo e da vegetação penetrou da alma do homem chinês, tornando-o não seco quanto tudo isso, a fim de não perceber um (quase) cadáver de uma criança na rua. Surge então o paradoxo: o país mais populoso e com menos humanidade.

Felizmente, ao contrário de muitos da China, há indivíduos que abrem mão do seu legado competitivo e fazem restaurar a fé na humanidade. Prova disso foi Meghan Vogel, atleta de Ohio, 17 anos, que abriu mão do penúltimo lugar na competição para ajudar sua concorrente, cujo corpo não aguentava mais correr. Meghan carregou a competidora por 30 metros, e então a empurrou para a linha de chegada antes de atravessá-la. Aqueles terão fluidez nas relações e abandonarão o caráter individualista e solitário, que entrega a sociedade aos antidepressivos, psicólogos e psiquiatras.

Enquanto a sociedade de "Equilibrium" precisa tomar Prozium para diminuir o nível emocional, o patrimônio histórico competitivo do nosso planeta erradica qualquer forma de sentimento. Se naquela ficção, membros da sociedade param de tomar a droga para voltarem a ter emoções, o que impede nossos homens de abrir mão da consequência do capitalismo e converter-se em pessoas, como as poucas existentes?