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Clara Leal Voltarelli
Criar Ribeirão Preto

Justificadas Macaquices

O povo brasileiro é essencialmente, corrupto. Esse comportamento que nos é endêmico advém conhecidamente de nossas raízes coloniais: dos sistemas corrompidos de fiscalização de sesmarias e ouro em santos ocos evoluímos para política dos governadores, voto de cabresto e a banal ação penal 470. É uma escala crescente de aprimoramento das técnicas corruptoras, que tornavam-se o único modo de operação no país. O honesto definha, o íntegro se depõe. E afinal sobrevive aquele que usa a vida privada para catapultar a pública e assiste a tudo como um espetáculo habitual.

O cidadão brasileiro notadamente se concede o direito de cometer infrações corriqueiras: como no trânsito, hospitais e até palanques. Confunde - quase como um daltônico não distingue cores - a esfera pública com a privada, utilizando esta última em favor da primeira. E nessa tresloucada dinâmica, o país caminha ao sabor do "Brazilian Way of Life", cartilha não oficial daqueles que efetivamente prosperam por aqui. Segundo ela, toda sorte de compadrios são válidos e os incestos individuais e políticos, salutares. Somos como o personagem Major Vidigal de "Memórias de um Sargento de Milícias", que levanta-se com pressa para atender a uma ocorrência e traja-se com colete oficial e calças de pijama. Nada muito surpreendente, e pautado em um episódio real do primeiro presidente do Brasil, Marechal Deodoro. O passado nos respalda.

Dessas aparentemente insignificantes infrações, partem casos maiores e mais escandalosos. Mas nada nos parece anormal, intolerável ou ameaçador. Vemos a corrupção com familiaridade. São mínimos, pois os protestos acerca da prorrogação dos julgamentos de corruptos do desgastado mensalão; e todos os tropeços políticos brasileiros explodem em um único e infrutífero episódio: o esfuziante junho de 2013. Além disso, é como se fôssemos lobos criados por macacos: comportamo-nos como tal, pois não temos contraexemplos práticos e difundidos. Não suportamos o gosto de piolhos alheios, mas não o sabemos. Não entendemos as condenações a Berlusconi e Itália ou o estardalhaço dos "Vatileaks", ambos por corrupção. Tal indignação não nos pertence, bloqueada pelas raízes do nosso submundo cultural.

Só entendemos, logo, a linguagem malandra e sorrateira através da qual fomos lecionados ao longo dos séculos. Convivemos com nossa corrupção como um câncer de infinitas metástases, que têm vida paralela. A corrupção não é inerente e internalizada, como macacos sempre agem como macacos e naturalmente comem piolhos; provavelmente em troca de alguma isenção de multa, taxa ou até justificativa. A História nos justifica.