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Mayara da Cruz Chiquini
Criar Ribeirão Preto

Esfinges, Sereias e Minotauros

Fabiano sempre se deparou com muros em sua vida. Desde o nascimento não encontrou mãos que o auxiliassem no árduo trabalho de transpor um muro que o segregava do tão esperado mundo novo. Sim, uma ilusão pueril. Ele logo percebeu que o "lado de cá" não é nada admirável. Ao contrário: é um imenso e perigoso labirinto a ser percorrido.

Assim como Fabiano, que nasceu "à moda de Cristo" no corredor lotado do hospital, milhares de crianças sofrem as cicatrizes da negligência dos órgãos públicos. Hospitais precários com suas filas infindáveis, escolas sucateadas com professores desqualificados e ausência de transporte de qualidade são alguns quadros que compõem o cenário do corredor da infância. O mais lastimável ainda é que no caminho de algumas não há migalhas mínimas de pão espalhadas pelo chão. E essas crianças ficam no início do labirinto à espera de abutres.

Contudo, existem Fabianos que conseguem, mesmo debilitados, alcançar o corredor da juventude. Neste, não se espera só comida; mas comida, diversão e arte. E nessa caminhada, vamos desejando uma vida inteira. Assim, a perspectiva de vitória nos permite lapsos de força e enfrentamos esfinges que nos desafiam, sereias que nos seduzem e minotauros que nos desejam. Porém, são apenas lapsos teseunianos e rapidamente percebemos que a vida é verdadeiramente pela metade. Os muros não desaparecem e nos desesperam: enfrentar a esfinge não é garantia de vaga a todos na universidade; o canto da sereia enfeitiça através do instinto de sobrevivência e muitos caem na prostituição e no tráfico; ademais, o minotauro do desemprego devora mundialmente 47% dos jovens.

Aquele que consegue atravessar por inteiro esse caminho tão conturbado torna-se, de fato, Teseu. Transbordando experiências e sabedoria, avista a ponta do fio que lhe condizirá à saída do labirinto. Sente o cheiro do prêmio após tantas lutas vencidas: desfrutar de uma velhice tranqüila. Doce engano, pois o Estado não garante, na prática, proteção, saúde, transporte, liberdade, respeito ou dignidade. Nossa constituição parece ter sido feita para "inglês ver". Teseu continuará lutando sozinho também fora do labirinto e será tratado como sucata idosa.

Do país em que não há teto para seus idosos, não há chão para suas crianças e, nas paredes, há buracos no lugar de garantias para seus jovens, não se pode esperar grandes progressos. Os ideais positivistas continuarão utopias aprisionadas na bandeira enquanto não levarem a ponta do fio até as crianças. Elas têm o poder de transformar o caminho da nação e faze-la admirável. Assim, esfinges, sereias e minotauros tornar-se-ão espécies extintas na vida de cada um de nós.