MELHORES REDAÇÕES DE ALUNOS

Lígia de Castro Paganucci
Criar Franca

Ó mar salgado!

O dia tenebroso chegara. Eu estava grávida fazia três meses. Meu filho era bastante desejado por mim e toda a família. Após dois anos de casada, finalmente, podia sentir uma pequena semente brotando dentro de mim. Porém, meu sonho de ser mãe ficara comprometido. Em um dos exames, minha médica detectou que meu bebê não tinha cérebro. A notícia veio como uma bomba. Sentia-me como os franceses que, na época da sua grandiosa revolução, estavam totalmente sem saída á beira de uma guilhotina.

As chances do meu filho nascer eram remotas. Não há curas, não há tratamentos. Não ter cérebro é não ter vida. Com o apoio de toda a minha família, tomei uma árdua decisão: não seguiria a gravidez. No ímpeto, liguei para a uma clínica clandestina e marquei um horário para fazer o aborto. Nessa hora, não havia percebido a complexidade do problema. Quando a percepção veio à tona, caí em um profundo abismo obscuro onde nem uma faísca era capaz de iluminar e acalmar a minha angústia de viver.

Eu queria muito ter aquele filho, mas as peripécias divinas haviam retirado essa graça de mim. Quantas noites em vão rezei. Quantas lágrimas escorreram em minha face. A cada gota, era capaz de sentir o gosto amargo da morte aproximando. Minha vida ia embora a cada neurônio a menos do meu bebê.

Hoje, estou aqui na sala de espera da clínica. A sala é pequena e está lotada de verdadeiras assassinas. Mulheres inconseqüentes e que buscam um alívio imediato. Posso sentir as vibrações e as tristezas de cada "pequeno" projeto de vida. A cada criança morta a sala de espera se torna tão grande e etérea. E meu bebê quer nascer, mas um "mísero" cérebro não do deixa.

De repente, uma sensação de alívio vai dominando meu corpo. Finalmente posso ver uma luz naquela imensidão. Saio correndo daquela tortura. Meu filho irá nascer e, já que ele não pode viver comigo irá viver em outras crianças. Vou gerá-lo para doar seus órgãos.

Se vale a pena? Tudo vale a pena se a alma não é pequena. Quem quer passar além do Bojador, tem que passar além da dor. "Esses versos de Fernando Pessoa nunca fizeram tanto sentido como agora. A alma pequena não irá deixar nenhuma lágrima salgar ainda mais aquele mar. A doce alegria de viver estará estampada no sorriso de algumas crianças salvas por mim e por meu filho.